All posts tagged: Manteigas

Mudar a fralda aos queijos

São cada vez menos os pastores que ainda fazem e vendem queijos de ovelha e de cabra. Etelvina Reis e Augusto Ribeiro tratam os seus como se fossem filhos a precisar de mimos diários. Uma história de trabalho partilhado. “Eu também vou com elas para Campo Romão, ali depois da antiga Pousada”, alerta Etelvina Reis. Elas são as 25 cabras e as 100 ovelhas, normalmente, guiadas pelo seu marido, Augusto Santos Ribeiro. No dia-a-dia as mãos de Etelvina estão mais ocupadas com a transformação do leite em queijo, mas isso não a impede de pastorear, se necessário. Também ela conhece as manhas dos animais. “O leite é mais fraco no tempo quente. Elas correm muito para as giestas e empinam-se para apanharem a flor. Parecem loucas por aquilo. Até fui provar as flores para compreender o gosto e são amargas”, diz com um sorriso largo, enquanto torce o nariz. “Para elas é como se fossem rebuçados de mentol, é o que eu digo!” Olha para a janela e aponta uma intersecção no caminho que vai …

Narciso e selvagem

Vaidosos, os narcisos selvagens espalham a sua beleza por entre os bosques e revelam-se antes de todas as outras flores. Anunciam a primavera entre carvalhos e pinheiros ou na orla das veredas que entram pela floresta. As pétalas dos narcisos selvagens foram-se abrindo, entre o sol e a sombra, ao longo de Março. Para observar e nunca colher os bolbos, avisa o herbário da Universidade de Coimbra: http://www.uc.pt/herbario_digital/Flora_PT/Familias/Amaryllidaceae

Mimo às manadas

A montanha não dá abrigo e alimento apenas às cabras e ovelhas. As vacas do vale da Castanheira pastam nos lameiros e comem centeio. Ainda com espanto e um sorriso, José Eduardo Brazete recorda um dos primeiros invernos em que começou a criar gado. “Andei à procura das vacas e não as via. Imaginava-as meio mortas, mas encontrei-as entre as giestas, vivas, todas juntas”. Ali, na Castanheira, a uma altitude de cerca de 980 metros, os meses mais frios podem ser bastante duros. No entanto, é neste ecossistema em pleno Parque Natural da Serra da Estrela que o agricultor de 59 anos encontra todos os ingredientes para cuidar da sua manada. “Os bezerros bebem leite e comem erva. Semeio centeio para elas comerem. Depois dou-lhes na primavera, enquanto ele [o cereal] está pequenino”, explica José Eduardo Brazete. O gado de José Eduardo Brazete, 21 fêmeas e 2 machos, vive em relativa liberdade nos 14 hectares da propriedade, apenas limitada pela cerca (pastor) elétrica. São uma mistura de duas raças francesas, “a charolesa, porque são vacas …

A azeitona apanhou um susto

Por causa do excesso de calor a azeitona amadureceu cedo e a colheita começou num ápice. Fomos espreitar o funcionamento de um lagar e descobrimos que o azeite ainda pode servir de moeda de troca. Em meados de novembro a apanha da azeitona ia quase no fim. No lagar transformava-se o fruto da oliveira com a certeza de que tudo estava a acontecer cedo demais. A primavera seca, a falta de água e muito sol assustaram a azeitona, mudaram-lhe o calendário e incomodaram-lhe a saúde trazendo algumas pragas: mosca e gafa. Os trabalhadores que apanharam a azeitona não precisaram de tanta roupa, como noutras campanhas bem mais frias e a entrar no inverno. Quem olha os campos à volta de Manteigas confirma que o tempo pode ter aquecido, contrariando a convenção, mas o olival tradicional, na maior parte dos casos, ainda se mantém intocável: as oliveiras são altas e não pequenas, organizadas, como nos olivais modernos, mesmo os que seguem o modelo de cultivo tradicional. Aqueles que fazem a colheita encostam escadas ao tronco para varejarem a azeitona que tomba sobre sarapilheira ou mantas …

Sair à rua para entrar na música

As duas bandas filarmónicas de Manteigas integraram onze novos alunos nas suas formações. Descobrimos quatro histórias de promessa, liberdade, nervos e… caganitas. O bocejo chegou depois das dez da noite. O ensaio decorria há mais de uma hora e os onze anos do corpo delgado de Sofia Serra começaram a ressentir-se do cansaço. A flauta transversal continuou em frente dos lábios. Apesar de não chegar com os pés ao chão, conservou as costas direitas. Para se manter alerta, de vez em quando, esfregou os olhos ou lançou o cabelo para trás dos ombros. Cada pequeno movimento, lento, disfarçado, feito nos momentos de pausa, valeu a pena para prosseguir com o treino até pouco depois das onze da noite daquela terça feira. Afinal, no sábado seguinte, dia 26 de dezembro de 2015, logo a seguir ao Natal, seria a sua estreia como um dos seis novos membros da Música Nova e iria apresentar as boas festas à população da vila. O primeiro dos dois dias de arruada começou às nove da manhã e “acabou pelas 16h30”, lembra. “Já me …

O verão não deu a última gargalhada

Os pássaros debicam a fruta nas árvores, mas deixam bastantes figos, pêssegos e maçãs para a D. Ermelinda secar ao sol. Assim se matam as saudades do calor durante o inverno. As três figueiras que Ermelinda Marcelino tem no seu terreno são partilhadas. Os pássaros comem uma pequena parte da fruta e os figos que restam ficam para ela. “Dá para todos, divido”, explica, satisfeita com esta distribuição tão ecológica, mas incomodada com “os figos que se desperdiçaram por não ter sido capaz de os apanhar”. Afinal, é para não desaproveitar a produção que, aos 74 anos, ainda seca, ao sol do verão, grande parte da fruta por si colhida. “Antigamente tudo era pobre, todos aproveitavam tudo para o inverno, tudo se guardava”, recorda sentada ao pé da lareira, na sua casa na aldeia de Vale de Amoreira, uma das quatro freguesias do concelho de Manteigas. Ermelinda Marcelino começou a secar fruta em pequena. A mais velha de nove irmãos, cuidava da casa enquanto os pais trabalhavam. “Quando podia, eu é que ia arrebanhando os figos …

O inferno fica além do poço?

A resposta talvez nunca surja, tantos são os focos de distração ao longo da caminhada: a flora exuberante, as paisagens imensas… O percurso começa e acaba no Poço do Inferno, uma cascata com cerca de 10 metros na Serra da Estrela. Segue pela ribeira de Leandres – o afluente do rio Zêzere que forma aquela queda de água – e acompanha bosques com castanheiros, faias e tramazeiras entre outras espécies de árvores e arbustos. A reportagem fotográfica do passeio:    

Olhe que são três a cinco euros!

No dia do mercado, uma vez por mês, a vila de Manteigas ainda sai a passeio. Tudo e nada se compra, desde meias a sofás, saias e sapatos. A mãe interrompe-o pouco depois de começar. Alto e moreno, José Pedro é vendedor de roupa. “Pedro é o último nome”, confirma sem muitos sorrisos. “Já venho à feira de Manteigas há uns 20 anos, primeiro ficávamos ali perto da igreja”, acrescenta. A mãe, Rosalina Graça, pequena, enérgica, não perde a oportunidade e corta-lhe o discurso: “Hoje em dia não se vende nada”. O filho tenta continuar a conversa, explicando que, nos primeiros anos em que a feira se mudou para o parque de desportos radicais, fora das ruas principais da vila, “ainda foi bom, vendia-se bem. Mas depois, “com o cair das fábricas de têxteis, tudo mudou. Faliram e o poder de compra diminuiu”. A mãe volta à carga: “Se calhar ainda vamos para pior. A China deu cabo de tudo”. O filho desiste, entrega-se às vendas e aos clientes. Os compradores não são muitos e ouve-se algumas feirantes …

A cabra comeu as nozes

Grelos salteados com queijo de cabra curado e nozes. Ingredientes da montanha uniram-se para criar um prato rápido e simples. A ligação entre os sabores é mais intensa quando se juntam produtos da mesma região. Os grelos de nabo aliaram-se às nozes apanhadas neste outono e ao queijo de cabra curado da Serra da Estrela. A receita foi feita a pensar nas nozes de montanha (veja “Saudável solidão“) e pode adaptar-se com facilidade. A versatilidade surge da sua natureza tão simples, afinal, tem apenas três ingredientes principais. É uma entrada, mas torna-se, num ápice, num almoço ou jantar vegetariano. Basta juntar batatas assadas ou puré de castanha. Também acompanha carnes de aves, mas convém reduzir a quantidade de queijo – apenas o suficiente para registar o sabor e a textura do lacticínio sobre os legumes. Pode transformar-se numa sandes colocando os três ingredientes sobre pão centeio integral. Não se coloca a possibilidade de acompanhar peixe. Seria necessário retirar o queijo que dificilmente combinaria com, por exemplo, salmão, bacalhau ou mesmo pescada. Por ser a primeira receita do migalho com nozes, o fruto da nogueira não …