Campo, Manteigas
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Saudável solidão

As folhas e a casca da nogueira têm qualidades terapêuticas. Os romanos já sabiam (quase) tudo sobre esta árvore que dá muito mais do que nozes.

Rejeita-se o quebra-nozes com o olhar no martelo e na tábua de madeira. As mãos pedem descanso e as nozes exigem uma pancada leve, seca e cuidadosa para ficarem inteiras. Uma tarefa típica do final do outono e do inverno, pois em Manteigas são muitas as nogueiras e raras as avelaneiras e amendoeiras.
A sabedoria popular, nesta vila, elogia a noz pela capacidade de melhorar a memória — não fora o fruto tão parecido com o cérebro. Ao longo da história muitos povos lhe foram encontrando qualidades. Os romanos, por exemplo, consideravam a nogueira uma árvore sagrada e as nozes um símbolo de fertilidade. Durante o império romano, nos banquetes em que se consumia carne sacrificada no altar aos deuses, após inúmeros pratos de caça, porco, ostras, marisco, pão, legumes, peixe e vinho, a refeição terminava com fruta: nozes, figos secos e uvas em conserva. Estes primores eram considerados não só os mais doces, mas os mais civilizados de todo o repasto.

Já nessa época as folhas da nogueira eram utilizadas pelas suas qualidades terapêuticas que, tal como a casca e a membrana verde que envolve o fruto têm caraterísticas antissépticas e adstringentes (que contrai, aperta e seca a superfície de um tecido). A infusão das folhas é hipoglicémica, reduzindo a quantidade de açúcar no sangue. Das nozes extrai-se óleo, utilizado na culinária, e a madeira da árvore é cobiçada na indústria do mobiliário.

Árvore solitária

Num passeio pelo vale de Manteigas deparamo-nos com nogueiras grandes, altas, que parecem ter acumulado anos de vida. Plantadas no extremo de um terreno cultivado, perto de uma estrada, ao pé de um ribeiro estão muitas vezes isoladas, sozinhas. Tamanha solidão por serem más vizinhas. Esta árvore produz um químico que perturba (ou impede, mesmo) o crescimento de outras espécies.
A nogueira começa a florir em abril, por vezes em maio se o frio for tardio. Em Manteigas a colheita é feita no outono, de forma artesanal e caseira. São apanhados os frutos que caem espontaneamente ou que são varejados dos ramos. A casca verde exterior é retirada manualmente e a noz seca ao sol. Para se chegar ao fruto adocicado, pequeno, de cor leitosa, típico destas nogueiras da montanha, é preciso partir a casca, com um tosco martelo e muita delicadeza.

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Fontes:

– Flandrin, Jean – Louis et.al. – Food – A culinary history, págs. 60, 125, 135, 212, 215 e 219, Penguin Books

– Câmara, Fortunato da – Alimentos ao sabor da história, págs.135 e 135, Colares Editora.

– Fundação de Serralves – ficha de espécie – Juglans Regia.

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